quarta-feira, 12 de junho de 2013

O que aconteceu nos atos e como a mídia conseguiu desviar o foco.


Pela milésima vez, desde que começaram as manifestações contra o aumento da tarifa do transporte público em São Paulo, venho aqui falar tudo que eu penso. Ao invés de ficar soltando textos esparsos no facebook, decidi sintetizar tudo em um lugar só. E, pela milésima vez, vou perder meu tempo tentando incutir em cabeças extremamente fechadas a patifaria que a mídia está fazendo na hora de noticiar os manifestos.

Em primeiro lugar, há, sim, um pequeno grupo que vandalizou e depredou o nosso querido patrimônio público – dupla de palavras que o brasileiro adora trazer à tona quando não concorda com algum tipo de manifestação. Porque, como bem disse Jean Wyllys, esse assunto da depredação nunca aparece quando o governo destrói reservas ambientais para construir condomínios de luxo; nunca aparece quando o governo, esse que amamos criticar do alto de nossos sofás, decidi demolir prédios por pura especulação imobiliária. O problema aqui é: esse grupo de vândalos não constitui a maioria da massa de pessoas que compõe o ato. As pessoas que amam criticar os atos de depredação parecem se esquecer dos outros 10 mil, 20 mil cidadãos que estavam meramente gritando, caminhando, pacificamente, sem encostar em nada – e que, mesmo esses, foram agredidos pela truculência indistinta e gratuita da PM. Porque, dessa, ninguém reclama. Afinal, ela está aí pra nos proteger. Ou, como a grande mídia adora informar, está aí para acalmar os ânimos dos manifestantes.

Nas próprias chamadas de notícias sobre os manifestos, os textos são sempre "manifestantes em confronto com a PM" e nunca "PM confronta manifestantes". Enquanto estudante de discurso, posso afirmar que a mera ordem das palavras na chamada já direciona, sutilmente, a formação da sua opinião e seu juízo de valor. Para se ter uma ideia da truculência da PM, procurem o vídeo da prisão do jornalista Pedro Nogueira. São SETE policiais cercando e agredindo, sem dó nem piedade (nem justificativa) um cidadão de bem que só estava lá para cobrir o ato. Ele estava desarmado. Ele estava com as mãos para o alto tentando diálogo. Mas PM não dialoga. Quando se tem uma arma e um cacetete na mão, não há diálogo. Há uso indiscriminado e abusivo de poder. Porque, nós sabemos, apenas pelo fato de serem policiais, se eles quiserem que você esteja errado, você vai estar errado. É assim que funciona e nada pode refutar isso.

Diversos colegas meus, pelos quais boto a mão no fogo, nos quais eu confio que jamais depredariam nada, sofreram com bombas de gás lacrimogênio disparadas a esmo, sofreram com agressões gratuitas apenas por estarem no meio da massa manifestante, apenas por estarem tentando dar voz a uma manifestação LEGÍTIMA.

O grande problema é que, como a mídia só noticia nos grandes veículos de informação as ações desse pequeno – reitero: pequeno – grupo de depredadores, todo o foco recai sobre eles. E aí, quem só acompanha jornais tende a achar que esse pequeno grupo constitui todo o grupo que está manifestando. E essas mesmas pessoas que não se dão ao trabalho de tentar enxergar o lado dos manifestantes deslegitima todo o movimento. É essencial acompanhar relatos de quem esteve lá, de quem apanhou, de quem sentiu os olhos ardendo e a garganta fechando por causa do gás pelo simples fato de estar se unindo ao protesto.

Na Praça da Sé, quando o grupo de mais de 10 mil pessoas se reuniu, choveu bomba do céu. Sem justificativa. Isso é "acalmar os ânimos"? Ninguém ali estava depredando nada. Ninguém estava quebrando nada. Estavam unidos. E a união incomoda. Incomoda porque, para quem acompanha notícias do sofá de casa, são apenas um bando de desocupados reclamando por causa de 0,20 centavinhos.

São só 0,20 centavos para você, que não depende do transporte público. Tem gente que já está pulando refeições para poder incluir esses 0,20 centavinhos nos gastos mensais, conforme reportagem que saiu na UOL. Saiam um pouco da bolha em que vivem, tenham um mínimo de empatia.

Algumas cidades do Brasil já conseguiram que a alta na tarifa fosse revogada. É fundamental que os protestos em São Paulo continuem. É fundamental que quem se limita a considerar o protesto como algo ilegítimo e os manifestantes como meros vândalos compareça aos protestos para ver qual é a real. É importantíssimo que se prestem, ao menos, a procurar relatos de quem estava lá. Não dá pra confiar na grande mídia e querer ter razão só porque "leu notícias sobre os atos".

Não to vendo ninguém reclamar da polícia que agride indistintamente nos atos, independente do agredido ter vandalizado ou não. Não to vendo ninguém glorificar o grupo, que com certeza não é pequeno, que não quebrou nada e foi protestar contra um aumento absurdo.
To vendo policial agindo de forma covarde. To vendo truculência injustificada.
Mas, pior do que tudo isso, to vendo gente apoiando. To vendo gente dizendo que "tem que meter borracha nesses vagabundos mesmo". To vendo gente nervosinha porque tem que gastar mais gasolina do carrinho pra desviar do trânsito que os "baderneiros" fizeram. To vendo gente com a mente fechada.
To vendo a mídia conseguir, de forma plenamente eficaz e em uma direção potencialmente irreversível, desviar o foco dos atos.

Eu lamento muito por todos que não querem abrir os olhos. Eu lamento muito por todos que consideram esse protesto como algo desimportante e ilegítimo. Eu lamento muito, muito quando vejo gente que sempre considerei inteligente e mente-aberta criticando os manifestantes sem se dar o trabalho de tentar enxergar o outro lado.

E se você ainda tem alguma intenção de criticar o manifesto, de chamar indistintamente todos os manifestantes de vândalos baderneiros, por favor, vamos interromper toda e qualquer forma de contato que nós temos, independente do nível do nosso vínculo. Eu não preciso e nem quero gente como você ao meu lado.

Informe-se. Abra a sua mente. Disponha-se ao diálogo. Faça o mínimo.


Um comentário:

  1. Mesma situação em Goiânia há uma semana atrás, por sorte (e evidências) conseguimos contornar a situação. Boa sorte São Paulo, que a ignorância não triunfe.

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